
Hoje, vi o filme A Substância com as expectativas em alta. A premissa parecia promissora - uma reflexão provocadora sobre a obsessão pela juventude, a pressão estética e o fardo invisível que o tempo imprime no corpo feminino. Sabia que não ia ser um filme fácil de digerir, mas esperava encontrar ali uma obra que me fizesse pensar, sentir, talvez até abanar um pouco por dentro. E, de certa forma, foi isso que aconteceu… mas não exatamente como eu esperava.
A Substância é um filme que caminha sobre uma corda bamba. De um lado, uma crítica social poderosa e necessária; do outro, um exagero estético que, por vezes, roça o gratuitismo. A narrativa é, sem dúvida, instigante — cheia de simbolismos e momentos de puro desconforto visual. Há ali uma intenção clara de nos confrontar com aquilo que preferimos ignorar: o culto à aparência, a efemeridade da fama e o preço absurdo que se paga para manter uma imagem idealizada.
A atuação de Demi Moore é sinceramente, arrebatadora. Surpreende-me - e incomoda-me - que não tenha levado o Oscar para casa. É daquelas performances em que vês uma actriz a entregar-se de corpo e alma, sem reservas. Há nela uma vulnerabilidade crua, uma fúria que queima por dentro, um desespero que nos prende ao ecrã - talvez ela se reveja na própria personagem?! É graças a ela que conseguimos mergulhar, mesmo que a medo, na espiral de loucura da personagem e do próprio filme. Não há ali vaidade nem proteção. Há entrega total.
E no meio de tudo - das cenas gráficas, dos delírios visuais, do grotesco que se impõe - o filme brilha, sim, em alguns momentos. Há uma inquietação genuína que fica contigo. Uma pergunta que ecoa, mesmo depois dos créditos finais: até onde estamos dispostos a ir para manter uma imagem que no fundo, nunca foi real? E a resposta, mesmo que não dita em voz alta, é brutal.
Mas... há um grande “mas” aqui.
Por muito que o conceito seja forte, a execução por vezes trai a própria mensagem. O filme entrega-se a uma estética do exagero que em vez de aprofundar o discurso, acaba por diluí-lo. O choque toma o lugar da reflexão. A violência gráfica, que poderia ser ferramenta de denúncia, transforma-se em espetáculo. E aí, perde-se o fio à meada. A crítica, que deveria ser incisiva e desconcertante, acaba soterrada sob uma avalanche de imagens que parecem competir para ver qual é mais extrema.
Não me entendas mal: não sou contra o cinema que provoca, que mexe connosco, que nos tira da zona de conforto. Aliás, adoro quando um filme me obriga a pensar e repensar. Mas aqui, o grotesco muitas vezes parece existir por si só, sem um propósito claro. E isso quebra a ligação entre aquilo que o filme quer dizer e a forma como escolhe dizê-lo.
No fundo, A Substância é para mim um daqueles casos em que a forma acaba por engolir o conteúdo. A crítica está lá. A dor está lá. A questão social e filosófica é válida e urgente. Mas a escolha por uma abordagem visualmente tão extrema faz com que a mensagem se torne menos acessível, quase oculta atrás do ruído estético.
Ainda assim, não consigo dizer que é um mau filme. Longe disso. É uma experiência intensa, desconcertante, marcante até. Só que também é desequilibrada. E por isso, o que poderia ter sido uma obra-prima contemporânea, torna-se apenas uma memória inquietante - daquelas que ficam a martelar cá dentro, mas mais pela forma do que pela substância.
Se vale a pena ver? Sim. Mas vai com o espírito preparado. Não é para todos. Não é leve. E, sobretudo, não é gratuito no que te vai fazer sentir - mesmo que o caminho até lá seja um pouco mais tortuoso do que deveria.
Classificação Pessoal ⭐⭐⭐